Correio dos Campos

Com programa que une punição e tratamento, índice de reincidência cai em Piraí do Sul

18 de maio de 2017 às 09:40

Para a Juíza Leila Aparecida Montilha, aplicação isolada da pena sem o tratamento da dependência de drogas não surte qualquer efeito para a ressocialização

 

Após constatar que aproximadamente 70% dos processos criminais e da Vara da Infância e Juventude tinham relação direta ou indireta com a dependência de álcool e demais drogas, a Juíza de Direito Leila Aparecida Montilha colocou em prática, em 2014, o projeto “Justiça Terapêutica”.

O programa busca aplicar medidas de tratamento aos infratores quando a prática de crimes está relacionada com o uso de drogas. Na maioria das vezes tais medidas são utilizadas como alternativa à pena e, em alguns casos, são aplicadas cumulativamente com a pena não privativa de liberdade.

Um dos fatores que também foi levado em conta pela magistrada era o alto índice de reincidência dos infratores, já que a aplicação isolada da pena sem o devido tratamento da dependência de drogas e álcool não surtia qualquer efeito para a ressocialização.

“Os mesmos infratores apareciam em novos processos que iam se multiplicando, assim o método surgiu de uma necessidade constatada na prática. Nesses casos a melhor opção é o tratamento”, explica a Juíza Leila Aparecida Montilha.

Ela ainda destaca que é verificada já no primeiro contato a necessidade da aplicação das medidas de Justiça Terapêutica no infrator, possibilitando um tratamento rápido e eficiente para mudar a vida desse infringente. “O esforço é no sentido de empurrar o preso a dar o primeiro passo para se livrar da dependência, iniciando o tratamento que se revelar mais adequado”, afirma a magistrada.

Aplicação de testes laboratoriais

O teste para o uso de drogas não é obrigatório, mas para a aplicação do programa basta a constatação de que o crime está relacionado ao uso ou ao vício de alguma substância ilícita. Em Piraí do Sul, na maioria das vezes o infrator acaba aderindo voluntariamente ao método.

Etapas do programa

O tratamento se desenvolve em três momentos:

– A primeira etapa é a chamada fase pré-judicial, onde será apurado se a infração guarda relação com o consumo de drogas. É a fase referente ao delito, que vai desencadear o propósito da ação penal. É uma fase prévia onde o programa não é aplicado ainda.

– Na segunda etapa e a mais relevante de todas, chamada de fase judicial, é onde se decidirá pela aplicação ou não do programa. Neste momento é apresentada a possibilidade ao infrator da participação e da aplicação do tratamento, mediante o projeto Justiça Terapêutica. Essa fase vai desde o momento anterior à proposição da denúncia, no qual poderá ser feita a transação penal, até o final do cumprimento da pena.

– A terceira e última chama-se terapêutica. É nessa fase que o tratamento efetivamente se desenvolve, sempre de forma individual. A partir desse último passo que acontece o encaminhamento do usuário, pelo Juiz, à instituição na qual será realizada a medida de tratamento, com o envolvimento de médicos, psicólogos e demais profissionais que estão envolvidos no programa.

Com a aceitação do tratamento, o infrator será entrevistado por uma equipe interdisciplinar, composta por integrantes de diversos saberes profissionais, como objetivo de se obter um diagnóstico geral do paciente.

Vantagens

Para a magistrada Leila Aparecida Montilha, a Justiça Terapêutica tem como sua primeira e grande vantagem a associação entre Justiça e saúde. Essa ligação entre as duas áreas acaba reforçando a ideia de que o problema das drogas diretamente relacionado a crimes é de responsabilidade de toda a sociedade.

“Cada vez mais a Justiça precisa contar com esferas de atuação multidisciplinar, a exemplo do que ocorre com o Direito de Família, do Eca e da Justiça Restaurativa”, salienta.

O programa tem como outra vantagem trabalhar para oferecer uma perspectiva de vida digna aos infratores e, consequentemente, a sociedade fica mais protegida, porque o número de reincidência diminui. A população é, portanto, interessada diretamente na recuperação efetiva do preso.

Trabalho em conjunto

Em 2016 a Juíza Leila Aparecida Montilha participou de um curso promovido pelo Ministério da Justiça que tratava do tema da integração de competências no desempenho de atividade judiciária com usuários e dependentes de drogas, o que a fez investir ainda mais na aplicação do método terapêutico na pena.

“Foi um curso excelente, intensificamos o programa e buscamos uma integração maior com a rede municipal e, assim, conseguimos aplicar o tratamento sempre que possível. Aqui no município, trabalhamos com o objetivo de que esse método consiga agir diretamente na melhoria das relações familiares, resgatando a cidadania do infrator”, finaliza.

O projeto Justiça Terapêutica é fruto de parceria entre o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Prefeitura Municipal (por meio de Programa de Saúde Mental-CAPS) e a Secretaria de Políticas Públicas AntiDrogas (por meio da ajuda entre grupos de Alcoólicos Anônimos e Amor-Exigente).

Prêmio de reconhecimento

Por essa iniciativa em 2016, ela foi uma das premiadas durante cerimônia do prêmio JUS XXI – “Inovação e Cidadania”, na categoria magistrados. O evento foi criado pelo Núcleo de Direitos do Cidadão do Tribunal de Justiça do Estado (Nucid) e pela Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) para homenagear e destacar as práticas de ações da política judiciária de cidadania nas Comarcas do Estado.

Ao receber o prêmio, a magistrada disse ter ficado muito feliz com a homenagem e por ter dividido esse momento com os demais colegas vencedores. “Foi muito gratificante, iniciativas dessa natureza servem de grande estímulo para continuarmos a dar o nosso melhor a cada dia, permitindo que o nosso trabalho, para além dos processos, possa ajudar na verdadeira pacificação social”.

Fonte: TJ/PR